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O (re)nascer do Sol

A história do casal que criou a marca de acessórios de madeira HAYÔ 

     Num sábado nublado e frio, a Pinacoteca acordou mais colorida. Além dos quadros que residem no interior do museu, outras obras de arte estavam expostas no lado de fora. A feira organizada pela rede Manual, que reune artesãos e pequenos empreendedores, oferecia apenas produtos feitos manualmente. Entre roupas, calçados veganos, porcelanas pintadas e brinquedos coloridos, Sandra Zimmermann me esperava na tenda que me chamou mais a atenção: a dos óculos de madeira da marca HAYÔ. Quando viu que me aproximava dos óculos, abriu um sorriso e disse que eu podia provar qualquer um, até que me apresentei e Sandra associou o rosto ao endereço de email. “Você é a jornalista que quer falar comigo!”, lembrou e trocou o sorriso de vendedora pelo abraço de colega. Decidimos usar o cenário do Parque da Luz para nossa conversa. Entre cigarros, Sandra me falou sobre a criação da HAYÔ, a sua redescoberta e o verdadeiro significado de sustentabilidade. 

para sustentá-los, mas que os contemplassem novamente e foi através de uma conversa com um profissional da área de branding, Mário Rosa, que descobriram que independente do projeto que fosse, seria uma marca com o DNA do casal. A partir de um momento de redescoberta, HAYÔ começou a ser estruturada: “Jörg sempre foi envolvido com causas ambientais, lutou contra a energia nuclear na Alemanha e se recusava a trabalhar em indústrias automobilísticas. Já eu sempre fui uma pessoa social, que acredita que todo mundo tem uma história que merece ser contado. Quando relembramos quem éramos, descobrimos que nosso projeto precisava unir essas características”. 
                                                                                             

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


daquele barco e me enxerguei no projeto”. 
     Depois de um ano aprimorando a ideia e a máquina criada por Jörg, no final de 2015, o casal recorreu a um financiamento coletivo para concretizar a criação da HAYÔ, que significa “sol” em patxôhã, língua falada pelos índios pataxós que também fazem parte da história da marca. O próximo passo foi se instalar na Bahia, onde iriam comprar materiais e melhorar o produto, que era avaliado pelas pessoas que colaboraram com o financiamento coletivo, formando uma espécie de grupo de testes, que usavam os óculos e mandavam feedbacks aos produtores por 2 meses. E foi só em 2017 que HAYÔ saiu paras ruas, para os e-commerces e para feiras como a Manual, onde Sandra conquista

conecta com a marca. “Meu primeiro óculos foi feito com um pedaço de madeira que meu avô levou pra casa e usava pra trabalhar. Quando eu contei essa história, recebi várias mensagens de pessoas que também tinham alguma história dos seus avós e isso nos conecta”, contou Sandra que tem consciência dos valores altos do produto e de que eles não são de primeira necessidade. Mas para eles, a conexão com o lema e com as histórias da HAYÔ, que podem ou não resultar em uma compra, é o que alimenta o crescimento da marca. 

O casal Sandra e Jörg

O casal Sandra e Jörg, donos da marca HAYÔ

Além da máquina criada por Jörg, os óculos são feitos à mão.

     Há 30 anos, Sandra, contadora de história
de nascença, jornalista por formação, conheceu
o alemão Jörg, um engenheiro mecatrônico,
durante uma viagem à Bahia. “Não me lembro
como foi, o que aconteceu, mas alguma coisa
aconteceu”, ela conta sobre o começo do
romance que acabou em casamento. Depois de
anos de casados, morando em São Paulo, suas
profissões pararam de fazer sentido e não os
preenchiam mais. “Costumo dizer que ele
passou a vida criando máquinas que alguém
dizia que fazia sentido construir e eu passei
muito tempo da minha vida escrevendo coisas
que alguém dizia que fazia sentido escrever”.
O casal sabia que precisava de um novo projeto

     Durante esse processo, Jörg já vinha construindo uma máquina que, inicialmente, servia para mexer com peças de metais. Mas como sempre foi apaixonado por madeira, percebeu que essa era a matéria prima que mais lhe dava prazer. “Depois de muito tempo de pesquisa, ele chegou pra mim e disse: ‘Vamos fazer óculos de madeira na Bahia?’ Eu levei um susto!”, Sandra lembrou. Quando questionado sobre a decisão, o engenheiro defendeu sua ideia com pesquisas e exemplos de pessoas que já vinham investindo no acessório, além disso, ele achava que a mudança para a Bahia funcionaria como um momento de resgate deles, como pessoas e como casal. Mesmo com uma ideia fechada, Sandra ainda não enxergava onde ela se encaixava no projeto. “Jörg voltou de uma das suas viagens de prospecção com algumas fotos. Uma delas mostrava meia carcaça de um barco, descartada na areia, e me mostrou ela falando ‘Nossa, quantos óculos eu consigo construir a partir desse barco’. Foi aí que eu pensei em quantas histórias podia contar através dos óculos criados com os restos 

os clientes com suas histórias e com os designs de Jörg. 
     Mas a marca não é feita só pelo casal, segundo a jornalista “o saquinho do óculos é costurado pela Mariana,
que é uma índia pataxó que conhecemos em Arraial. O maior ajudante do Jörg é o Júnior, que, por acaso, é também pataxó e muito talentoso, a gente brinca que ele enxerga pelos dedos. O tecido que usamos é comprado a
venda da esquina do atêlie. Afinal, a gente não se mudou pra Arraial pra ficar comprando pela internet materiais costurados em porões do Brás”. Para Sandra, essa é mais uma das características que fazem HAYÔ uma marca consciente, já que acha que a sustentabilidade não é só usar madeira descartável ou não usar elementos químicos, só vegetais, como nós fazemos. Claro que sustentabilidade envolve o reaproveitamento de material e o menor impacto negativo ambiental possível, mas também engloba uma cadeia ética, transparente, desde quem costura até quem comercializa, e que consegue mexer com a economia local.

     Para os donos, o público da marca é formado não só por quem já comprou um óculos, mas por quem se

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